Era
uma vez um homem muito tolo cuja primeira esposa havia morrido logo após o
nascimento de sua primeira filha, Simone. Sentindo-se solitário e apreensivo
pela responsabilidade que sua esposa lhe deixara, o homem decidira casar-se
novamente com uma mulher, viúva, chamada Nísia, que tinha duas filhas, para
assim “poder dar uma mãe a sua filha”, o que na verdade mascarava um ardiloso
desejo, que era o de poder fugir das tarefas do lar.
Machonildo
casou-se quando Simone tinha apenas onze anos. Sua nova esposa era uma mulher
que todos diziam ser muito arrogante e extremamente vaidosa. Nísia passou a ser
assim julgada depois que o marido passou a beber desenfreadamente e desabafar
sua sofrência nos bares do povoado – o homem não aceitava ter que dividir as
tarefas do lar e a responsabilidade em educar as meninas.
As
gêmeas, Betty e Frida, eram mais velhas que Simone meia década. Ouviam-se
boatos de que elas não se davam bem com a filha do padrasto. Muitas pessoas da
região diziam até que as irmãs invejavam a beleza de Simone. Fofocas que não
passavam de mentiras inventadas por homens que não tinham lotes para capinar e
mulheres que ainda não ouviram falar na palavra da sororidade, irmandade
feminina. Simone e as gêmeas se davam muito bem, pareciam até irmãs de verdade.
Irmãs trigêmeas. Não pela aparência física, pois até mesmo as irmãs gêmeas não
eram iguais, mas pela personalidade e gostos.
Foi
então que num belo dia de domingo, Machonildo morreu. O Homem tinha cirrose. Tantos
anos bebendo desenfreadamente e nunca ninguém lhe alertara disso, foi o que ele
pensou antes de dar o último suspiro. O pobre homem não era rico, não tinha
muitas posses, morrera e só deixara para sua família a pequena fazenda em que
viviam mais uma pequena renda mensal que sua esposa passou a receber de três arrendatários
que viviam no local.
Um
dia, o arauto do rei chegou ao povoado e convidou todas as jovens do reino para
comparecerem, no fim de semana, a um baile no palácio, pois o príncipe Bonzão, herdeiro
do trono, queria escolher uma esposa. Betty estava comprando verduras e frutas
na feira quando ouviu o comunicado do oficial. “Oba! Uma festa... um baile!
Deve ser tão legal... vou chamar minhas irmãs, quem sabe até uma de nós não tem
chances com o príncipe... hum! Ele é tão bonitinho...”, pensou a moça.
Quando
chegou a casa, a primeira coisa que a moça fez foi chamar as irmãs e a mãe para
contar as novidades, contudo estas já estavam sabendo. Todos do povoado, quem
sabe do reino, já sabiam. Só se falavam nisso.
— Ah, então vocês
souberam pelos vizinhos... mas e aí, me digam, irão? Betty perguntou.
— Eu não sei... acho
muito estranho isso de o príncipe dar uma festa só pra escolher uma esposa...
falou Frida.
— Concordo! Foi a vez
de Simone se expressar.
— Não estou entendendo
o que querem dizer, sejam mais claras... reclamou Betty.
A mãe das meninas resolveu então se pronunciar.
— Meninas, o que Frida
talvez esteja querendo dizer é que achou machista o fato de o príncipe dar um
baile para escolher uma esposa, como se nós, mulheres, fossemos objetos a
disposição dele...
— Credo! Nem tinha
percebido isso... eu não quero mais ir. Uma pena, ele parecia bonitinho até
fazer uma merda dessas! Disse Betty, decepcionada.
—
Muito menos eu... príncipe machistinha... Jamais quero estar com alguém
assim... Falou Simone.
Aquele acontecimento rendeu uma reflexão crítica tão
profunda nas meninas que elas decidiram boicotar o baile machista do príncipe
machista. Foi então que com a ajuda de umas amigas, Rosa, Emma, Judith e
Gloria, elas saíram pela vizinhança comentando sobre o baile do príncipe que
estava mais para uma feira em que as mulheres eram os produtos.
Mesmo tendo conseguido convencer muitas moças a não
irem ao baile, as meninas sabiam que sem uma ajuda mágica elas jamais
conseguiriam em tão pouco tempo alertar todas as mulheres da maneira tosca como
o príncipe as via. Foi assim que Simone e as gêmeas decidiram ir à floresta
encantada a procura de Miss Andry, mulher que na região era conhecida como
bruxa, apesar de nunca terem-na visto praticando bruxaria.
—
Então vocês querem que as mulheres do reino tomem consciência da massa de
manobra patriarcal que é o baile real? Disse a famigerada bruxa.
—
Sim, Miss Andry. Mas para isso nós precisamos de sua ajuda... não temos como
impedir a realização do baile em si, mas se as moças do reino não forem...
dizia Betty até ser interrompida por Simone.
—
Nós faremos o que você quiser, Miss Andry, mas por favor... nos ajude...
Miss Andry concordou em ajudar, na verdade ela teria
feito isso – boicotar o baile - mesmo sem o pedido das moças. Porém ela
aproveitou a oportunidade para praticar suas misandrias.
—
Cada uma de vocês terá que fazer um homem chorar até a meia-noite deste dia.
Quando o homem estiver chorando, enxuguem as lágrimas dele com um de seus
lenços. Depois, costurem os lenços, de modo a se ter apenas um. Após isso,
bordem no lenço a palavra misandria com linha preta. Na madrugada, as exatas
três horas, enterrem o lenço perto da entrada de minha casa, próximo às mudas
das flores-cadáver. Antes de irem embora, repitam três vezes: “nós somos
misandrinhas”.
Tendo aceitado as condições, as três irmãs saíram da
casa da bruxa imaginando como conseguiriam fazer três homens chorar. No
caminho, encontraram três homens perdidos na floresta. Um deles estava chorando, morto de medo de
nunca mais conseguir sair daquele lugar. Frida não perdeu tempo. Ofereceu seu
lenço branco e macio, o qual o homem não hesitou em aceitar.
Os outros dois homens demostravam mais controle
emocional que o companheiro choroso, atém riam do homem ser tão “fracote”.
Simone resolveu apelar para a sensibilidade.
—
Olhem só, este pobre homem chorou porque tem sentimentos nobres! Provavelmente
ele imaginou como seria a sua vida e a de vocês se ficassem aqui presos,
perdidos nessa floresta que até dizem ser encantada, ou melhor, amaldiçoada...
reparem neste buraco, perto daquela árvore... quem de vocês seria o primeiro a
cair nele? Quem?
—
Eu, provavelmente, disse chorando um dos homens que até pouco tempo zombava do
amigo choroso. Sempre fui muito desastrado e distraído.
Simone então ofereceu seu lenço para o moço enxugar
suas lágrimas advindas de uma fatalidade que nem havia acontecido. Assim que o
homem devolveu o lenço de Simone, o outro que estava até então calado, começou
também a chorar. Antes mesmo de ele dizer o porquê, Betty ofereceu seu lenço.
—
Imaginem vocês, amigos e moças que já considero amigas de tão prestativas que
estão sendo com nós, que depois de dias perdidos nessa floresta, Arthur caísse
dentro do buraco, logo tentando ajudá-lo, eu cairia também, em seguida,
tentando me ajudar por ter tentado ajudar Arthur, Cesinha cairia também no
buraco e lá, os três, morreríamos sem ajuda...
Depois de imaginar tamanha fatalidade os homens não
se aguentaram. Foi então homem chorando, berrando, urrando, latindo, piando,
rodando pra todo lado... Quase que as irmãs não conseguiram fazê-los sair
daquele frenesi.
Enquanto isso, no palácio, príncipe Bonzão se gabava
por ser o assunto do momento. O homem estava com o ego inflado.
—
Quero tudo perfeito para esta noite. Quanto mais eu impressionar as mulheres,
melhor... Meu baile será lembrado para sempre... mandarei até registrar o
acontecimento em texto... quem sabe em um conto de fadas? Falava baixinho para
si mesmo.
Finalmente o grande dia chegou. E com ele as
lágrimas de príncipe Bonzão. Sua festa fora um fiasco. Teve suntuosidade. Teve
gastos. Teve boa comida e boa bebida. Teve a melhor música real. Teve até o que
não se imaginaria ter: muros reais pichados. Só não teve a presença de nenhuma
mulher. Nem a rainha mãe comparecera.
—
Que horror, minha deusa! Serei chacota
do reino inteiro. De todos os reinos. Quiçá do mundo. Não poderei viver com
isto... a partir de hoje renunciarei a meu futuro reinado e me isolarei do
convívio social... Disse o príncipe Bonzão, com um nó na garganta por ter
prometido isso em voz alta e para os homens presentes ali no baile, os quais
eram seu único público.
Dois ou três homens ainda tentaram impedir príncipe
Bonzão de abandonar o palácio, mas foi em vão. O homem estava decidido.
Chegando a floresta, ele viu uma casa e resolveu invadi-la para ver o que
encontrava por lá. Ele poderia ter ido à cozinha e aproveitar para lavar a
louça ou poderia ter ido ao quintal capinar um lote, mas o príncipe preferiu
entrar em um quarto sem mesmo pedir licença.
Lá, ele viu
uma linda moça dormindo profundamente, então, do nada, se achando o bonzão, ele
resolveu beijar essa moça, mesmo não tendo o consentimento dela. Porém, antes
que seus beiços tocassem nos lábios da jovem, surgiu uma bruxa misândrica e
transformou o príncipe num pequeno sapo.
— O que fizeste comigo, bruxa má!
— Aprenderás agora que mulher nenhuma é mercadoria,
Bonzão, muito menos está à espera para ser a “escolhida” por um cara que acha
que só porque é homem ou da realeza pode dar festas para escolher mulher ou
invadir casas e se aproveitar de mulheres inconscientes.
— Oh! Mas eu não fiz por maldade... por favor...
esse feitiço precisa ser quebrado... eu não posso ficar para sempre sendo este
sapo imundo!
— Você virou um sapo porque quis beijar uma moça sem
o consentimento dela, logo você só voltará a ser homem se uma moça quiser
beijá-lo, mas assim, como você está... em pele de sapo. Disse Miss Andry,
poucos minutos antes de desaparecer numa nevoa mágica.
Desesperado por ser um príncipe
sapo, Bonzão começou a chorar. Chorou tanto que acordou a bela moça adormecida
a quem ele alguns minutos antes tentara beijar indevidamente.
— Oh! Querida minha! Eu lhe acordei... viva! Viva!
Que belos são seus olhos...
Quando percebeu o sapo lhe falando
estas coisas a moça se espantou e deu um grito. Bonzão logo tentou se explicar.
Contou então tudo para a moça que ficou perplexa.
— Então me diga minha bela jovem, você não gostaria
de me beijar para que eu possa novamente ser um belo príncipe? Só assim
poderemos nos casar! Você será minha rainha e junto a mim reinará por estas
terras...
— Você dá um baile para escolher uma esposa, entra
na minha casa sem permissão, tenta me beijar sem consentimento e ainda me
acorda do meu sono de beleza e acha que eu me interessaria em beijá-lo e com
você me casar? Não sou obrigada, prefiro ter um sapo falante, queridinho. Disse
Femista.
Príncipe Sapão, não mais Bonzão,
viu que não adiantaria mais apelar. A moça estava decidida. Assim ele aprendeu
a não mais desumanizar as mulheres.
Os anos se passaram e nunca mais ninguém
por aquela região ouviu falar em bailes machistas nem em mulheres submissas.
Simone, Frida e Betty foram com a ajuda de Miss Andry, precursoras de sua
própria libertação. As gerações futuras ainda ouviram falar em um sapo falante
numa lagoa, o qual dizia ser um príncipe que há muito havia habitado o povoado.
Histórias que o povo conta.
Lizandra Souza.
adoreeeiii
ResponderExcluirSOCORRO EU AMEI ESSA HISTORIA DUM JEITO
ResponderExcluirPRINCIPALMENTE NESSA PARTE "Ele poderia ter ido à cozinha e aproveitar para lavar a louça ou poderia ter ido ao quintal capinar um lote, mas o príncipe preferiu entrar em um quarto sem mesmo pedir licença."
SERIO
EU SEMPRE PENSO ISSO
Adoooooorei! Deu vontade de imprimir e sair distribuindo para as meninas.
ResponderExcluirvontade de distribuir mentiras né?
ExcluirMuito boa essa história adoreii
ResponderExcluirVou imprimir e colar nos banheiros dos restaurantes,nos ônibus,em cada lugar que eu puder!!!
ResponderExcluirArrasoooou
ResponderExcluirArrasoooou
ResponderExcluirQue estória maravilhosa, eu amei!
ResponderExcluirEu amo esse teu alter ego "Miss Andry". Menina tu tem talento! *-*
ResponderExcluirhuahauhau adorei! Vou salvar para contar para meus futuros filhos!
ResponderExcluireu tenho pena de vc que vai perder o seu tempo,
Excluirem contar um monte de mentiras pro seus futuros filhos.
Amei ❤ Ri muito e fiquei feliz, com uma vontade enorme de mostrar esse texto a todas as meninas q estão a espera do seu Príncipe Bonzão.
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