Brincadeira de criança... |
Feminismo é um movimento social, político
e filosófico que, em síntese, busca o fim do patriarcado, isto é, o sistema de
dominação-exploração da mulher pelo homem/cis, para, desta forma,
conseguir a equidade social, política e econômica entre os gêneros. Essa
definição, muitas vezes entendida apenas de forma genérica, não explicita
como se manifestaria essa igualdade política e social entre os sujeitos, muito
menos, aponta para as especificidades de tais sujeitos, sobre quem são e como
são constituídos socialmente.
Como consequência primária desse quadro,
os sujeitos para os quais busca-se a tal equidade se resumem, no nosso
pensamento e discurso, na maioria das vezes, as mulheres e homens adultos, não
me atrevo nem a apontar que a existência de pessoas não-binárias seja
visibilizada em tal discurso. Secundariamente, invisibiliza grupos sociais
historicamente marginalizados e silenciados, como a população infanto-juvenil,
sobretudo a infanta.
Crianças negras sofrem com o racismo,
crianças gordas sofrem com a gordofobia, crianças pobres sofrem com o elitismo,
crianças LGBTs sofrem com a LGBTfobia, crianças com deficiência sofrem com o
capacitismo, crianças, sobretudo meninas, sofrem com o machismo, crianças só
por serem crianças sofrem silenciamento e etarismo (discriminação etária).
Diante disso, eu lhe pergunto, seu feminismo é para crianças e
(pré)adolescentes? Isto é, seu feminismo contempla essa população? Acolhe? Dá
visibilidade e voz a esse grupo social? Pauta por ele?
Eu vejo quando essa questão é levantada em
espaços de militância que muita gente responde que sim as perguntas, mas,
nesses mesmos espaços, quando o assunto maternidade compulsória é levantada,
por exemplo, muitas das mesmas militantes que responderam sim anteriormente,
usam como argumento contra a imposição da maternidade o discurso de que
"não querem ser mães porque não gostam de crianças", "crianças
são chatas, insuportáveis" e até que "odeiam crianças", isso,
segundo elas, quando são questionadas, no ''figurativo''.
Tal atitude é lamentável e
injustificável*, ainda mais vinda de quem se diz feminista. Quando uma
feminista diz que não gosta de crianças, que crianças são chatas,
insuportáveis... ela não está só sendo etarista, mas também está excluindo
mulheres que são mães do feminismo. Pensemos, que mãe vai se sentir acolhida e
ver sororidade numa militante que discursa ódio contra suas filhas e filhos? E
que criança (ou pré-adolescente) vai criar empatia pela palavra
"feminista" se ela escutar de uma feminista que "crianças são
insuportáveis"?
Eu tenho uma prima de 7 anos que há um
tempo se interessou em saber o que era feminismo quando me viu administrando a
página deste blog no Facebook. Mostrei uns memes para ela e ela me disse que
iria ser feminista também. Conheço umas meninas de 12 anos que já se
intitulam feministas. Na minha página, já recebi RELATOS de crianças de 11, 12
anos. De meninas que sabiam que podiam procurar uma página feminista para desabafar
sobre determinada violência que sofreram. Já tive alguns alunos e alunas do
ensino fundamental II, 6º e 7º anos, que demonstraram interesse pelo movimento
feminista quando eu falava sobre em sala de aula. Conheço e conheci crianças
que sofreram diversos tipos de abusos: físicos, sexuais, psicológicos,
emocionais. Portanto, eu repito meu questionamento anterior, que
criança (ou pré-adolescente) vai criar empatia pela palavra
"feminista" se ela escutar de uma feminista que "crianças são
insuportáveis"?
Não privem nossas crianças e
jovens do movimento só porque muitas vezes eles não possuem AINDA uma
maturidade para entender teorias, pois o que importa é levar a prática
feminista na vida da população infanto-juvenil, não teorias de gênero e exploração
sexual.
Me pergunto, a feminista que diz que não
gosta de crianças porque crianças são (supostamente) chatas está promovendo uma
militância que proporcione o empoderamento infantil? Que abra espaço para lutar
para que essas crianças não sejam oprimidas? Está possibilitando que o
feminismo, não em teoria, mas em PRÁTICA, chegue na vida dessas crianças? Das
MULHERES-mães dessas crianças?
Se o discurso coincidir com a prática, o
que é esperado, não.
Você que já foi criança, não lembra
como era ruim ouvir que você era chata só porque você não era adulta? Não
lembra como te negavam direitos básicos? Como te silenciavam? Como era foda
sofrer algum abuso e não ter a quem contar? A quem pedir ajuda? Socorro? Já
parou pra pensar no que as crianças que leem ou escutam esses discursos pensam?
Sentem? Já pensou que você pode estar ajudando no silenciamento de uma
criança?
Para concluir, deixo abaixo alguns
depoimentos de jovens feministas que se manifestaram na primeira versão desse
texto, que eu postei há umas semanas no Facebook, no meu perfil pessoal.
*Maternidade compulsória não se combate com discursos etaristas, mas com discursos de desconstrução da ideologia machista que naturaliza a reprodução feminina como destino inalienável de toda mulher. Você pode dizer que não quer ser mãe porque maternidade não está nos seus planos, porque ser mãe é uma escolha, não uma obrigação, logo você optou por não ser, que ter filhos é uma responsabilidade que você não quer assumir para si etc. Dizer que odeia crianças é como dizer que odeia idosos, gays, negros, mulheres. Porque legitima socialmente a marginalização dos sujeitos preteridos.
Lizandra Souza.
Migas, sou psicóloga e trabalho em um município do interior. Aqui o feminismo é muito pequeno, bom algumas mulheres nem sabem o que é isso. Porém, em meu trabalho com algumas crianças de um programa (meninos e meninas), comecei a trabalhar com eles termos feministas. Estamos construindo um livro de termos que chamamos de "dicionário diferente" lá estamos escrevendo e construindo o significado de vários termos feministas. Me sinto responsável por apresentar essa prática para eles, também no dia-a-dia de trabalho tenho que desmistificar vários preconceitos acerca das mulheres. Mas enfim, vamos pra luta!
ResponderExcluirQue maravilha, miga, parabéns e continuemos nessa luta, quanto mais "sementinhas" feministas espalharmos, melhor!
ExcluirQue linda! parabénsss, vamos juntas à luta S2
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